domingo, 18 de dezembro de 2011

Um bode expiatório para os "aloprados"

A imprensa divulgou estes dias os desdobramentos das investigações referentes à "lista de Furnas", um documento falso elaborado por um estelionatário contratado por políticos do PT. O objetivo da fraude era acusar políticos adversários de usarem as mesmas práticas corruptas que o PT vinha usando, bem como servir para salvar Lula de um possível processo de impeachment que pudesse derivar das investigações sobre o "mensalão" (aqui). Lembrei-me imediatamente de um pequeno texto que escrevi por ocasião de um evento ocorrido na UFPR em 2010, o qual reproduzo abaixo:

- - - - - - - - - - 

Há poucos dias, a Universidade Federal do Paraná homenageou os deputados que foram autores de emendas ao orçamento da União que a beneficiam com recursos. Foi uma boa iniciativa do reitor. Afinal, os deputados recebem solicitações de verbas de todos os lados, de modo que tendem a priorizar aquelas que possam lhes trazer maiores dividendos eleitorais. Homenagens como essa podem tornar as demandas da universidade mais interessantes para os deputados, aumentando as chances de que sejam atendidas. 

Mas foi pena que um dos homenageados, Dr. Rosinha (PT-PR), tenha aproveitado os minutos que lhe foram dados para fazer um discurso autoritário contra a imprensa. Ele comentou que é errado pensar que todos os políticos são iguais e reclamou que homens de bem são obrigados a perder tempo se defendendo de acusações infundadas. Acrescentou também que isso acontece por vivermos num mundo em que "empresas privadas" de comunicação atacam "homens públicos". Ele deve achar que só empresas estatais tenham credibilidade para noticiar denúncias contra homens públicos, embora sejam justamente essas empresas as mais suscetíveis a pressões políticas. 

Além de expor essa visão política autoritária, suas palavras me lembraram de alguns fatos. Vejamos: 
  • Em 1998, uma quadrilha tentou vender documentos falsos que serviriam para acusar tucanos como FHC e Mário Covas de manterem conta bancária em paraíso fiscal. A notícia sobre a existência do "dossiê Cayman" só não foi mais explorada pelo PT na campanha eleitoral porque a falsidade dos documentos mostrou-se evidente desde logo. 
  • Eduardo Jorge, quando era secretário-geral do governo FHC, foi acusado e investigado pelo Ministério Público sem que houvesse indícios de ações ilícitas que ele tivesse cometido. Embora tenha sido provado que ele era inocente das suspeitas gratuitas que lhe foram lançadas, sua imagem pública foi prejudicada pelo vazamento ilegal de informações sobre os atos investigatórios. José Dirceu admitiu que o PT cometeu um "erro" ao explorar politicamente o caso, mas só quando estava na berlinda por causa do escândalo do "mensalão". Ele queria ser visto como alguém tão injustiçado quanto sua vítima. 
  • Em 2006, dois petistas foram presos pela polícia federal com mais de 1,7 milhões de reais em dinheiro vivo. A quantia seria dada ao empresário Luiz Antonio Vedoin em troca de um dossiê fajuto que serviria para associar José Serra e Geraldo Alckmin à máfia das ambulâncias. E ainda havia outros petistas envolvidos nas conversações com Vedoin, embora afirmassem não saberem nada sobre o dinheiro. Lula qualificou o episódio como obra de uns poucos "aloprados" sem importância, mas pelo menos dois membros do grupo eram diretamente subordinados a ele e pertencem ao seu círculo de amizades. 
Eu ainda poderia mencionar outros fatos, como a famosa "lista de Furnas" e o dossiê sobre os gastos com cartões corporativos. Poderia também comentar as denúncias de que o PT estaria preparando um dossiê para ser usado na atual campanha para a presidência, o qual, para não variar, seria baseado em informações falsas e/ou em suposições desonestas construídas a partir de dados obtidos ilegalmente. Mas a comparação entre os fatos já citados e a fala do Dr. Rosinha é suficiente para mostrar o óbvio: petistas usam a imprensa para moer reputações e, depois, fazem dela bode expiatório para explicar o motivo de tantas pessoas acharem que os políticos são todos iguais. As teorias conspiratórias que a esquerda usa para justificar o "controle social" dos meios de comunicação servem também para escamotear os efeitos corrosivos do vale tudo eleitoral do PT sobre a confiança no regime democrático. 

Petistas como o Dr. Rosinha andam tão acostumados com essas teorias que não deixam passar nenhuma oportunidade de repeti-las. Nem mesmo os poucos minutos de exposição que lhe foram dados na homenagem prestada pela universidade aos deputados. A iniciativa do reitor foi correta. Mas sempre há um ou outro político que aproveita para verter seu palavreado autoritário e arranjar bodes expiatórios. Realmente, os políticos não são todos iguais.

OBS.: Publicado originalmente em 22 de junho de 2010 no site do Instituto Millenium.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Seu comentário foi enviado e está aguardando moderação.