quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Por que tratar de política aqui. Ou: por que a maioria não aprende com a realidade?

Pode parecer estranho ficar tratando de política num blog que, conforme está dito logo aí em cima, se destina a dar tomatadas na geografia e no sistema de ensino atuais. Mas não é. A predominância de teorias e ideologias anticapitalistas nas ciências sociais e em nosso sistema de ensino faz com que inexista, por definição, quaisquer distinções entre posicionamentos político-ideológicos, propostas de políticas públicas e opções teórico-metodológicas em nosso universo acadêmico. 

Quem diz isso nem sou eu, mas os próprios autores que eu critico aqui. Aqueles que se inspiram em gente como Paulo Freire e Milton Santos são justamente os primeiros a dizer que é impossível separar ciência, educação e ideologia e a acusar os intelectuais que deles discordam de serem “ideólogos”, “de direita”, “neoliberais”, etc. Nesse sentido, a refutação da teoria social crítica e da pedagogia freiriana tem necessariamente de mostrar, pela análise da crise política das esquerdas, o elevado grau de dogmatismo, autoritarismo, simplismo e incoerência que acomete essas correntes. Afinal, não são os autores dessa estirpe que falam da necessidade de "colar" a reflexão teórica à prática? 


No caso brasileiro, isso tudo é de uma visibilidade cristalina. Por razões históricas variadas, o PT tornou-se o maior partido de esquerda do Brasil e, com a chegada de Lula ao poder, o maior partido de todo o nosso quadro político. E a maioria dos geógrafos brasileiros é simpatizante desse partido ou até petista de carteirinha, o mesmo valendo para a maior parte dos cientistas sociais brasileiros. 

O mais incrível, porém, é ver que, embora essa escolha partidária implique cometer erros de análise gigantescos, a realidade não tem o poder de induzir a maioria dos nossos professores e pesquisadores a rever suas teorias radicais e escolhas políticas. Comigo não foi assim. As ideias que me levaram a simpatizar com o PT me foram incutidas explicitamente pelos meus professores do ensino médio, assim como aconteceu com a maioria dos estudantes na década de 1980. Mas o choque com a realidade e as leituras que fiz durante a faculdade e depois me levaram a mudar minhas visões. Vejamos um resumo rápido: 
  • Quando o Plano Cruzado foi implantado, vi gente da CUT e do PT, tais como Lula e Luiz Gushiken, aparecerem na TV dizendo que esse plano havia arrochado os salários e aumentado a concentração de renda. Acreditei piamente nisso, mas só até ler artigos nos quais os dados estatísticos comprovavam que havia acontecido justamente o oposto. Percebi que havia sido enganado por aqueles que meus professores haviam me apontado como heróis. 
  • A convivência com militantes petistas, durante minha breve passagem pelo movimento estudantil, me provou que o PT não era um partido socialista democrático coisíssima nenhuma, pois todas as suas tendências eram autoritárias mesmo! 
  • Anos depois, com o Plano Real, lá vieram de novo PT e CUT gritar que o governo estava arrochando salários e beneficiando “as elite”. Mas eu já estava vacinado e, de fato, a Pesquisa de Emprego e Desemprego – PED, entre outras fontes, provaram que aquela cambada continuava mentindo insistentemente para fazer a mentira virar verdade, no melhor estilo leninista e nazista! 
  • O sucesso do Plano Real, ao lado de outros eventos históricos mais antigos, como a Queda do Muro e o fim da URSS, reforçaram minha convicção de que os teóricos marxistas, mesmo aqueles de maior sofisticação intelectual, como Maria da Conceição Tavares, Belluzzo, Chico de Oliveira, entre outros, não conseguiam dar uma dentro! 
  • Aí veio o governo Lula. O estelionato eleitoral praticado demonstrou indubitavelmente o que já havia ficado claro nos anos anteriores: que a CUT é pelega e que o PT não tem projeto de transformação estrutural do país coisa nenhuma. E provou também algo muito importante: a maior parte dos nossos “grandes intelectuais” mente tanto quanto os políticos e sindicalistas dessas entidades. O “intelectual militante” não é intelectual; é um militante disfarçado de pesquisador. 
  • O estelionato eleitoral, somado ao aparelhamento do Estado e das agências reguladoras, explicitaram que a motivação dos sindicalistas e políticos ligados ao PT, principalmente daqueles que ocuparam as duas funções, como Lula, Delúbio Soares e Gushiken, é ocupar posições de poder na máquina pública e em fundos de pensão de estatais para subir na vida. Não é à toa que, hoje, Gushiken dá gorjeta de R$ 100,00 a garçons. Para quem realmente manda dentro do PT, que é sua ala sindical, o socialismo nunca foi um objetivo final.
  • Por fim, o cortejo infinito de escândalos de corrupção que marcaram os governos Lula e Dilma me revelaram que nem do ponto de vista ético pode-se esperar qualquer coisa positiva do PT.
A realidade me obrigou a rever minhas ideias. Por que o mesmo não acontece com a maioria dos que foram doutrinados no ensino médio e na universidade? Deixo a pergunta em aberto.

2 comentários:

  1. Não tenho a resposta, e também me intrigo com a pergunta, mas creio que também há muitos geógrafos e intelectuais de outras áreas, anticapitalistas, que passaram a ser ou sempre foram completamente céticos quanto a qualquer esperança de o PT, ou mesmo a "esquerda" (pelo menos na política institucional), serem "heróis" ou qualquer coisa do tipo. Somente não deixaram de ser anticapitalistas nem passaram a acreditar mais na direita ou em partidos conservadores por isso... e, se nada ou quase nada positivo pode vir do PT ou outros partidos de esquerda, menos ainda, talvez, da direita ou de partidos conservadores, ou mesmo do PSDB... assim como o seu, de repulsa total, este também é um posicionamento coerente, na minha opinião. E, a propósito, meu posicionamento nesta questão específica atualmente está suspenso para longa revisão e reparos ainda pouco previsíveis. Abraços, e parabéns pelo blog.

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    1. Esse posicionamento só é coerente se vier acompanhado de uma revisão das teorias. Afinal, se "a verdade da teoria é a prática social", como sempre disseram os marxistas, não faz sentido desiludir-se da esquerda política sem reavaliar as teorias anticapitalistas.
      Isso não significa necessariamente abandonar o marxismo ou a esquerda, mas o fato é que não há como continuar sustentando que as velhas críticas ao capitalismo estão corretas, sem qualquer necessidade de revisão, se a derrota do marxismo se deu, antes de mais nada, na prática.
      Noutros termos, não vale fazer o que Carlos Walter, Boaventura de Souza Santos e a maioria dos intelectuais críticos fazem, isto é, dar de barato que as teorias de Marx estavam corretas na crítica ao capitalismo e, depois, apelar para teorias "pós-modernas" no intuito de dizer que, agora, a revolução socialista virá das minorias sociológicas em aliança com os pobres em geral.
      Tratei disso em vários posts já publicados aqui. Basta pesquisar pelo marcador Carlos Walter ou pelo nome de Boaventura.

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