terça-feira, 7 de maio de 2013

Capitalismo é ecológico quando os consumidores assim desejam, como prova o agronegócio

Um erro fundamental do marxismo e de outras vertentes da teoria social crítica é a tese de que, como a origem do lucro estaria na exploração do trabalho, as decisões dos empresários seriam determinadas pela esfera da produção, de modo que pouco ou nada teriam a ver com as "reais necessidades" da sociedade. Além de ser autoritário e pretensioso julgar-se em posição de saber quais são as "reais necessidades" dos outros, os teóricos e militantes de esquerda erram ao supor que as decisões sobre o quê e como produzir sejam descoladas dos desejos e expectativas dos consumidores. Numa economia competitiva e de mercado, como é a capitalista, ganha mais dinheiro quem for capaz de atender melhor a essas expectativas e desejos, de sorte que são os consumidores que, em última análise, definem quais produtos devem ser produzidos e como deve ocorrer a produção.

É aí que entra a questão ambiental. Repete-se incessantemente que o capitalismo é anti-ecológico porque o interesse em lucrar leva os empresários a utilizar os recursos naturais de forma predatória, sem preocupação com o futuro. Todavia, há muitos exemplos a demonstrar que, quando o mercado exige produtos ambientalmente sustentáveis (seja lá o que isso signifique), o empresariado simplesmente se adapta à demanda. Faz algum tempo, saiu uma matéria interessante na Revista Época que ilustra isso muito bem. Não tenho o link para a versão on line da matéria, mas reproduzo parte dela abaixo:
A fazenda São Marcelo, de Mato Grosso, recebeu em março a visita de dois representantes da macar italiana Gucci. Grandes compradores de couro, eles estavam interessados numa característica única do produto de lá. Essa fazenda e outras três propriedades, todas do grupo JD, são as primeiras do mundo a receber o selo verde para pecuária. É um atestado de que a propriedade cria suas reses dentro da lei. Não derruba árvores sem autorização. Registra todos os funcionários. Não mata a onça que come os bezerros. E ajuda a recuperar a mata rala do entorno dos rios. Não se trata de caridade. O objetivo é agradar ao exigente mercado externo, cada vez mais atento ao comportamento dos fornecedores. 
[...] A nova certificação, elaborada pela Rede de Agricultura Sustentável (RAS), uma entidade latino-americana de organizações conservacionistas, exige uma auditoria independente para verificar cada etapa da vida do boi e ainda envia fiscais para conferir as práticas da fazenda certificada.
Obter o selo foi um trabalho árduo. É preciso atender a 136 critérios, da redução da emissão de gases do efeito estufa ao bem-estar do animal.
[...] O selo da RAS existe desde 1992 e está hoje em mais de 250 mil fazendas em 33 países. São propriedades agrícolas que produzem 30 diferentes culturas, entre elas café e cacau. É a primeira vez no mundo que uma fazenda de pecuária recebe a certificação. [...] No caso do café, o preço do produto aprovado pela RAS costuma ser entre 20% e 30% superior ao do mercado (Ribeiro, 2012, p. 46-47).
O desenvolvimento de métodos ambientalmente sustentáveis de produção depende da continuidade dessa mudança cultural que tem levado os compradores (indivíduos e empresas) a serem exigentes não só em relação às características dos produtos, mas também quanto às formas de produção e comercialização desses produtos. E depende também, ou até mais ainda, do aumento da renda per capita e da produtividade do trabalho. Somente assim é possível tornar os custos inerentes à sustentabilidade mais leves para o bolso dos consumidores. Afinal, dificilmente pessoas pobres vão se dispor a pagar até 30% a mais por um cafezinho sustentável. 

O caso em pauta é um ótimo exemplo disso. De acordo com Péricles Salazar, presidente da Associação Brasileira de Frigoríficos - Abrafrigo, "existe um nicho de mercado interessado nesses itens [certificados], mas o povão quer mesmo é pagar um preço menor" (Idem, p. 47). Por conta disso, Arnaldo Eijsink, presidente do grupo JD, esclarece que o investimento em sustentabilidade é uma aposta, não garantia de sucesso. Em suas palavras, "o boi que chega primeiro ao rio é o que bebe água limpa. O que vem depois só encontra sujeira" (Idem, ibidem). Vejamos a conclusão da reportagem:
Além da maior segurança na operação - imune a possíveis multas ambientais ou processos trabalhistas - ele [Eijsink] acredita que, a longo prazo, terá mais competitividade no mercado. O namoro com a Gucci é um sinal (Idem, ibidem).
No setor pecuário, a vanguarda da sustentabilidade ambiental são as madames que compram sapatos Gucci e os grandes grupos empresariais do Mato Grosso...

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RIBEIRO, A. O boi ao lado é verde. Época, n. 725, p. 46-47, 9 abr. 2012.

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